O movimento docente da rede federal e a unidade na luta com o movimento popular

Decisões da entidade definidas no seu 43º Congresso podem contribuir para construirmos a unidade na luta. Foto: Reprodução/ASPUV

Por Adelson Fernandes Moreira, militante do Movimento Brasil Popular

Em janeiro deste ano ocorreu o 43º Congresso do ANDES-SN, na Universidade Federal do Espírito Santo, um espaço importante para balizar uma atuação sindical e popular junto ao movimento docente nacional.

Uma síntese dos textos de conjuntura, que inclui uma caracterização do governo Lula e como este importante sindicato nacional enxerga a forma de enfrentamento ao governo, além de algumas propostas de resolução aprovadas, podem contribuir para construirmos a unidade na luta.

Sobre a conjuntura

Os textos presentes no Caderno que foi preparatório ao Congresso convergem em grande medida na caracterização da prolongada crise do sistema capitalista e seus desdobramentos na Guerra da Ucrânia, no genocídio praticado por Israel contra o povo palestino, na acentuação da exploração da classe trabalhadora e dos recursos naturais dos países periféricos, como o Brasil, dependentes dos países capitalistas centrais.

A Guerra da Ucrânia e o genocídio na Palestina, além de garantirem os lucros da indústria armamentista, no capitalismo em crise, cumprem também o papel de fortalecer o imperialismo estadunidense em meio ao delineamento de uma geopolítica multipolar marcada pela atuação da China, de sua aliança política, econômica e militar com a Rússia, e da consolidação dos BRICS, como instituição promotora de trocas comerciais e apoio econômico recíproco, alternativos à esfera de influência dos Estados Unidos.

A acentuação da exploração da classe trabalhadora  e dos recursos naturais dos países periféricos se faz dentro de uma democracia liberal fragilizada e por isso cada vez mais ameaçada pela ascensão de grupos de extrema direita, que se credenciam a aplicar a agenda neoliberal, porém, se apresentado como alternativa fora do sistema político em crise, empunhando bandeiras de luta contra a imigração, o feminismo, os direitos dos grupos LGBT e um conjunto de políticas afirmativas reconhecidas dentro dessa mesma democracia liberal.

No plano nacional, há convergência quanto à centralidade de fortalecer as mobilizações de rua no enfrentamento à extrema direita e ao governo Lula, especialmente sua política econômica configurada pelo Novo Arcabouço Fiscal (NAF) e todos os seus desdobramentos no desmonte do serviço público e das políticas sociais.

No enfrentamento ao governo Lula há caracterizações desse governo que vão desde aquela que admite colocá-lo no caminho certo do cumprimento do programa social referendado nas urnas até a que afirma explicitamente o objetivo de derrotá-lo junto com a extrema direita. Em sentido geral prevalece a tese de enfrentar um governo subjugado e aderido às forças do capital.

Em todas essas caracterizações falta conferir ao Congresso Nacional o papel que ele tem desempenhado no sentido de representante maior dos interesses do capital financeiro, do agronegócio e das mineradoras e, nessa toada, criador de todas as dificuldades possíveis para que o governo Lula não cumpra os compromissos sociais assumidos na eleição de 2022 e se submeta à agenda neoliberal.

Greve dos trabalhadores da educação pública federal

São confrontados no texto dois balanços distintos da greve dos trabalhadores da educação pública federal. O balanço defendido pela diretoria do sindicato nacional e pelo Renova Andes aponta os limites da pauta conquistada, mas afirma que foi a conquista possível diante de um governo intransigente no cumprimento das metas do NAF e, ainda, que a saída unificada da greve foi uma decisão construída na base, assim como a sua deflagração, que a continuidade da greve implicaria um enfraquecimento contínuo com o desfecho de uma saída fragmentada, dentro de uma correlação de forças ainda mais desfavorável.

As correntes de oposição à diretoria, diferentemente do Renova Andes, que também se coloca nesse campo de oposição, são implacáveis em um balanço crítico da greve, acusando a aliança governista entre os grupos de sustentação da diretoria e o Renova Andes, que traiu a categoria ao construir a saída da greve em um momento de forte mobilização, arrefecendo a importante denúncia dos efeitos deletérios do NAF, do compromisso do governo com o mercado financeiro, em detrimento da valorização e fortalecimento do serviço público. Para esses grupos o movimento docente saiu derrotado da greve com um acordo cheio de incertezas, muito distante da pauta econômica que levou ao movimento paredista.

O fato é que o cumprimento de vários pontos do acordo de greve têm sido adiados sistematicamente pelo governo fazendo com que uma parte importante do plano de lutas do setor das Instituições Federais de Ensino (IFE) seja dedicado a manter a mobilização e a pressão ao governo pelo cumprimento do acordo de greve.

Participação do ANDES-SN no Fórum Nacional de Educação (FNE)

Com base nos textos de análise de conjuntura, foi majoritária a posição de não participação no Fórum Nacional de Educação e a construção de uma instância alternativa que procure incidir na tramitação da lei do Plano Nacional de Educação (PNE), buscando garantir a destinação de todo o fundo público para a educação pública, no patamar de 10% do PIB, e o combate aos aspectos da proposta do PNE que favorecem a política de privatização da educação pública.

No texto de apoio (TA) do Grupo de Trabalho de Política Educacional (GTPE) do ANDES-SN, que se desdobra no texto de resolução (TR) que indica a não participação no FNE, está assim fundamentada essa posição:

É preciso pensar na ocupação de qualquer espaço sempre como uma questão tática, no sentido de que esse espaço deve servir para combater as políticas neoliberais e de destruição da educação pública. Ocupar o FNE nos ajuda ou atrapalha nesse sentido? A reconfiguração institucional do FNE, realizada desde o governo Temer, o constitui cada vez mais em um mecanismo de legitimação do governo e hegemonizado por grupos empresariais, sem espaço para diálogos efetivos na perspectiva da luta da classe trabalhadora e não nos possibilita margem de manobra na disputa da política educacional, ao contrário, nos coloca numa posição de referendar a política orientada pelo MEC e, portanto, neste sentido não devemos participar de sua composição atualmente. ([1], p.160)

Por sua vez, a corrente Renova Andes, como de outra feita, em Congressos anteriores, defende a participação do ANDES-SN no FNE com o argumento da importância de interferir na versão final do Plano Nacional de Educação junto com outras entidades representativas de estudantes e de trabalhadores da educação no sentido de uma política educacional que garanta o financiamento e a proposição de diretrizes para uma educação pública universal, laica e de qualidade socialmente referenciada.  ([1], p. 173). 

A não participação no FNE foi aprovada no 43º Congresso, mantendo o ANDES-SN em uma condição de isolamento na disputa da política educacional brasileira.

Enfrentar o Congresso Nacional

Nos textos do Congresso não encontramos uma proposição específica que coloque a necessidade de enfrentamento ao Congresso Nacional, para além da pressão pelo cumprimento do acordo de greve. Na jornada de lutas prevista para início de março o Legislativo Federal será pressionado a destravar o orçamento para que o reajuste estipulado no acordo de greve seja devidamente implementado.

A combinação de diferentes formas de luta e a correta compreensão da correlação de forças, que pressiona o governo Lula para a implantação de uma política econômica neoliberal, implica um enfrentamento ao Congresso Nacional em sentido mais amplo e com mais intensidade, nos moldes em que ocorreu a reação ao projeto de lei do estupro (PL 1904/24).

Aproximação com o campo popular

Teses aprovadas apontam ações que podem aproximar da luta no campo popular a atuação das Seções Sindicais do ANDES e, portanto, são importantes para a construção da unidade do movimento sindical, nas esferas municipal, estadual e federal, seja envolvendo as entidades representativas dos trabalhadores em educação, seja as demais entidades representantes de movimentos sociais e da classe trabalhadora. Por exemplo:

Combate ao ensino à distância

Que o Setor das Federais realize um painel, com representação da coordenação do GTPE, sobre o papel das universidades virtuais e demais modalidades de teletrabalho e de ensino com contratação precária por bolsas e tutoria. 

Que o ANDES acompanhe o Novo Marco Regulatório do Ensino a Distância e reafirme sua luta contra a implantação da Educação a Distância junto às seções sindicais.

Luta contra a privatização da educação pública

Que o ANDES-SN, em conjunto com as seções sindicais, estabeleça parceria com os sindicatos da educação básica na luta contra as diferentes formas de privatização das escolas. 

Que o ANDES-SN, em conjunto com as seções sindicais, debata com a sociedade sobre os desmontes generalizados da concepção histórica de escola pública e o avanço da privatização, que torna cada vez mais o direito à educação uma mercadoria. 

Luta contra a militarização da educação pública

Que o ANDES-SN mantenha as lutas contra a militarização da educação pública brasileira, exigindo do MEC, dos governos estaduais, municipais e distrital, o posicionamento contrário a esse modelo, propondo a imediata desmilitarização das instituições existentes, e avançando na construção de estratégias e espaços de articulação com as demais entidades para combater as escolas cívico-militares. 

Luta pelo Piso Salarial Profissional Nacional para os Profissionais do Magistério Público da Educação Básica (PSPN)

Realizar, no segundo semestre de 2025, um Seminário Nacional sobre Carreira Docente, precedido de etapas regionais, em articulação com sindicatos da educação básica dos Estados, Municípios e Distrital pautando a Luta pelo Piso Salarial Profissional Nacional para os Profissionais do Magistério Público da Educação Básica (PSPN) e sua adoção como referência para a carreira única do ANDES-SN;

Realizar uma campanha pela adoção do Piso Salarial Profissional Nacional para os Profissionais do Magistério Público da Educação Básica (PSPN) como referência do piso gerador da malha salarial dos(as) docentes da base do ANDES-SN;

Que a execução da Campanha de Valorização do Piso da Educação Básica envolva articulação com sindicatos da educação pública dos estados, municípios e do Distrito Federal.

Política de saúde e seguridade social

Defender a manutenção da vinculação constitucional de saúde no mínimo nos termos previstos no art. 198, § 2o, Inciso I da Constituição Federal. 

Lutar pela não retomada do artigo 40-A da PEC 66/2023, que estende as regras referentes às aposentadorias e pensões dos servidores públicos federais aos servidores estaduais e municipais, permitindo aos estados e municípios definirem regras ainda mais severas em relação às contribuições. 

Luta contra os Regimes de Recuperação Fiscal

Que o Andes-SN, via suas secretarias regionais e seções sindicais, dê continuidade ao trabalho de unidade de ação com os demais servidores públicos estaduais, visando fortalecer as Campanhas Salariais e as recomposições de perdas inflacionárias, intensificando a mobilização de base; dê continuidade à luta contra os todos os regimes de recuperação fiscal que retiram direitos; lute pelo Revogaço das Leis Complementares nº 159/2017 e nº 178/2021 que se referem aos RRF anteriores que retiram direitos dos servidores públicos; e articule junto ao Grupo de Trabalho sobre Verbas e com a Auditoria Cidadã da dívida, debates sobre o Propag nas bases, assim como materiais gráficos (cartilhas, folders etc) denunciando os impactos do RRF e similares, e das isenções fiscais sobre os serviços públicos e servidores públicos estaduais;.

Política Agrária, Urbana e Ambiental

Que o ANDES-SN e as suas seções sindicais construam articulações com movimentos sociais populares com vistas a promover ações solidárias para contenção de efeitos de grandes eventos climáticos extremos sobre a classe trabalhadora; participe e construa o IX Encontro de Pesquisadores(as) e Professores(as) na Mineração, bem como a Brigada Carlos Drummond de Andrade do MAM em Fortaleza-CE, estimulando a participação das seções sindicais na construção do evento; estimulem a construção das Jornadas Universitárias de debate na Mineração, assim como das Jornadas Universitárias em defesa da Reforma Agrária.

Estimular que as seções sindicais promovam debates e reuniões coordenadas pelos Grupos de Trabalho sobre Política Agrária, Urbana e Ambiental (GTPAUA) locais para preparar a ação do ANDES-SN e dos movimentos sociais na COP 30.

Estimular as seções sindicais que promovam painéis, seminários e debates acerca dos 10 anos do crime sócio-ambiental da Samarco em Mariana, a aviltante condição das populações indígenas no Brasil (ameaçadas permanentemente pelo avanço da fronteira agropecuária e por novos empreendimentos energéticos e minerários), a degradante possibilidade de exploração de petróleo e gás na Margem Equatorial, entre outros temas de interesse de cada região.

Conclusão

Esses excertos estão longe de abarcar com a necessária completude o conjunto de resoluções aprovadas no 43⁰ Congresso do ANDES-SN.

São apresentados com o objetivo de destacar algumas possíveis lutas unitárias no campo educacional e no conjunto da sociedade, nas esferas municipal, estadual e federal. Os textos preparatórios podem ser lidos na íntegra aqui. Sigamos juntos na luta!

Este é um artigo de opinião pessoal e não necessariamente representa a posição do conjunto do Movimento Brasil Popular

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