
Ataques iranianos em Tel Aviv e Jerusalém Ocidental colocam em xeque o “Domo de Ferro” de Israel. Foto: Agência de Notícias da República Islâmica
Texto de Fabiano Sousa, militante do Movimento Brasil Popular no Ceará
Nesta última sexta (13), as Forças de Defesa de Israel (IDF) bombardearam duas instalações nucleares do Irã e mataram algumas lideranças militares do país, como o general Hossein Salami, Comandante-chefe da Guarda Revolucionária, um exército a parte e com função de protetor da revolução islâmica de 1979; o Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Mohammad Bagheri; o general Gholamali Rashid, vice-comandante das Forças Armadas regulares e cientistas responsáveis pelo projeto nuclear pacífico desta potência regional do oriente médio. A forma como isso ocorreu será devidamente esmiuçada mais adiante.
O Irã respondeu no dia seguinte bombardeando Tel Aviv e Jerusalém Ocidental, com a maioria dos misseis sendo interceptados, mas com uma pequena parte atingindo o país, mostrando que a proteção aérea de Israel, o chamado “Domo de Ferro” não é essa defesa expugnável que a propaganda do Estado sionista tanto apregoa. Estamos nos encaminhando para o 5° dia de conflito, em que ambos os lados continuam a lançar ataques aéreos um contra o outro, podendo resultar em uma guerra regional sem precedentes que pode mudar a face do Oriente Médio.
Queremos destacar em primeiro lugar a facilidade de Israel em seus ataques ao Irã, onde seus caças entraram com certa tranquilidade em Teerã matando as lideranças citadas acima com alta precisão, mostrando a que ponto a força aérea iraniana foi debilitada por ataques de Israel ao país em 2024, mas a isso, se soma outro elemento importante: a emboscada que Donald Trump preparou para o Irã em conluio com Netanyahu. Neste mesmo fim de semana em que ocorreram os bombardeios israelenses, haveria mais uma rodada de conversas entre lideranças estadunidenses e iranianas sobre o andamento ou não do projeto nuclear destes últimos.
O país estava em “guarda baixa”, e isso também foi muito bem aproveitado por Netanyahu. A aliança estratégica e vital entre Washigton e Tel Aviv de 7 décadas e meia se mostrou bastante eficaz. Por isso, para nós, os EUA sabiam previamente do ataque e os dois países partiram para uma estratégia em comum nesse momento: a mudança de regime no país mulçumano. Netanyahu venceu um voto de desconfiança no parlamento israelense há poucos dias e agora, teoricamente fortalecido, ele teria 6 meses no mínimo de governo para realizar quase o que bem entendesse, convencendo e arrastando os EUA para uma nova fase de enfraquecimento de seus inimigos e dos norte-americanos.
A este momento se somou a ofensiva aos principais aliados do Irã na região: o enfraquecimento do Hezbollah no Líbano, a queda do regime de Bashar Al-Assad na Síria, o enfraquecimento parcial das bases de lançamento de misseis dos Houtis no Iêmen e a limpeza étnica e genocida contra o povo palestino em Gaza, agora com seus representantes político-militares, o Hamas, em situação bastante delicada. Mas e os países árabes ou de maioria muçulmana? Onde está a real solidariedade destes países para com outro país mulçumano em apuros?
O que ocorre é que por mais que tenha havido algumas aproximações entre Arábia Saudita e o regime de Teerã, temos que levar em consideração a rivalidade que marca o mundo islâmico: Sunitas x Xiitas. Praticamente todas as monarquias árabes mais próximas são sunitas e olham para o regime xiita do Irã com desconfiança e em último grau como rivais. No nosso entendimento, não haverá solidariedade destes países com o Irã, a não ser que os israelenses passem a uma “etapa nuclear” do conflito.
É bom destacar que Trump e Netanyahu incentivam movimentos separatistas de grupos armados curdos no noroeste do país (os curdos representam de 10 a 12% da população iraniana) e também as pretensões territoriais do Azerbaijão sobre o norte do Irã. A cooperação entre Baku-Tel Aviv-Washington tem natureza militar e estratégica. Sem falar nos movimentos oposicionistas e dissidentes que já demonstraram sua relativa, mas não desprezível força em 2009, sintetizado no “movimento verde”, também na época da primavera árabe, entre 2012 e 2013 e recentemente em manifestações pela liberalização do regime no início desta década.
A aposta numa solução a “lá Líbia ou Síria”, de desintegração do país em vários territórios e guerra civil fraticida deve estar na mesa dos israelenses e norte-americanos como uma das hipóteses. Mas, acreditamos, que hoje, não será pela interferência militar de potências ocidentais que se levará ao fim do regime, que tem raízes muito profundas na sociedade iraniana, com o apoio sólido da maior parte do povo iraniano e que neste momento, o ataque israelense e quem sabe de outras potências ocidentais como os EUA, pode levar a uma maior união do povo persa contra um inimigo em comum.
Mas onde estão a China e a Rússia neste momento, as maiores aliadas do governo de Teerã? A última coisa que os chineses querem agora é uma guerra de natureza regional, que envolva uma potência nuclear e que pode atrapalhar seus negócios e seu rápido e contínuo crescimento rumo à liderança econômica mundial de forma inquestionável. A guerra hoje é um mau negócio, exatamente por isso, o seu envolvimento é pouco provável, apesar da parceria com Teerã, em especial na compra e venda de petróleo. Mas são mais os iranianos que dependem dos chineses do que o contrário. A China continuará com seu discurso diplomático.
E a Rússia? Os russos e os iranianos têm parceria de natureza estratégica e de cooperação militar, ao ponto de trocas constantes de tecnologia militar entre ambas as potências, resultando no desenvolvimento de drones usados pelos russos na guerra na Ucrânia a partir de tecnologia iraniana. Estes últimos deram grande impulso a sua indústria militar nesse quesito na última década. Vale lembrar também que Moscou teve uma grande perda na região com a queda do regime de Assad na Síria e que domina a incerteza da manutenção de suas duas bases militares no país em frangalhos e fragmentado em uma longa guerra civil. A queda do atual regime iraniano poderia ser considerada mais uma derrota para Putin, numa região considerada essencial para a Rússia de qualquer época (da época Czarista ou da União Soviética).
Alguns analistas geopolíticos afirmam com certas ressalvas e outros categoricamente que essa aliança Moscou-Teerã é uma farsa. E mais, que com a segunda eleição de Trump, Putin e este teriam realizado um acordo/uma troca: Irã (mais a Síria) pela Ucrânia. Apesar do tom mediador e bastante ameno por parte do Kremlin, isso não se traduz em abandono ao regime de Teerã. Acreditamos que tem muito mais a ver com os problemas gerados pela guerra na Ucrânia. A Rússia já perdeu na casa dos centenas de milhares de soldados nesta guerra e junto às fortes sanções que sofreu por parte dos EUA e União Europeia, ainda se encontra debilitada para dar apoio militar ao seu aliado, neste momento. Se envolver em outro conflito poderia levar a derrotas em ambos pode calcular os analistas no Kremlin. Portanto não acreditamos nesta análise/hipótese destes analistas. Mas qual será o futuro do Irã? Do Oriente Médio? Das forças antiimperialistas? E do mundo, de uma maneira geral?
Primeiramente, como militantes de esquerda, devemos levar adiante o nosso princípio antiimperialista de autodeterminação dos povos e condenar veementemente o ataque do Estado genocida de Israel. Segundo, que nós temos um lado nesse conflito, que seguindo este princípio, deve ser o total e incondicional apoio ao Irã. Sua derrota representa uma derrota de todos os povos oprimidos do mundo e uma espetacular e estratégica vitória do imperialismo no mundo. Sabemos de todos os problemas relacionados àquele regime, em especial no que tange aos direitos civis das mulheres e LGBTI’s. Mas neste momento crucial da História, não podemos titubear. Seria uma derrota para todos os que lutam por direitos humanos no mundo também. Uma vitória de Israel é uma vitória também do racismo, do apartheid e do genocídio, do qual que vivem os palestinos nesse momento.
Terceiro, é justamente porque o Irã não tem bombas nucleares que Israel age de forma ensandecida no Oriente Médio afora e realiza estes ataques contra um país soberano, que realizava seu desenvolvimento de um programa nuclear para fins pacíficos seguindo à risca o que a ONU demandava. Israel age do jeito que lhe convém também pelo apoio incondicional dos EUA a qualquer ação do Estado sionista, este é hoje, sem sombra de dúvida o maior perigo à paz global. Quarto, a isto se soma a denúncia dos crimes contra a humanidade cometidos pelo Estado genocida e sionista, onde pudermos: na mídia popular, sites, canais progressistas do YouTube, nas ruas e nos muros Brasil a fora. E também devemos nos somar na luta pelo rompimento do Brasil com o Estado de Israel. Sabemos da dificuldade de um governo de minoria no parlamento brasileiro e que vive acuado pela ascensão de uma extrema direita vinculada ao fundamentalismo religioso com fortes ligações com o Estado de Israel. Mas é nosso papel, enquanto movimentos e partidos de esquerda, reivindicar esta demanda ao Governo/Itamaraty.
Por último, também devemos reivindicar dos países aliados do Irã que ajam com mais força e tenacidade em favor deste país e não só com discurso retórico. O melhor exemplo disto, por enquanto, parece ser o Paquistão, que chamou o Irã de país irmão e exigiu reação de todos os países islâmicos. Esperamos que China e em especial a Rússia de fato tomem atitudes mais contundentes, como um pedido pelo cessar fogo imediato e se possível a que elevem a pressão sobre Israel, visto que justamente agora o seu aliado principal, os EUA, parece estar ensaiando uma participação muito maior neste ataque sem precedentes ao território iraniano. A luta em defesa da paz mundial é uma luta pela humanidade, é uma luta dos povos oprimidos. Estamos do lado certo da História.
Abaixo ao imperialismo!
*Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a posição do Movimento Brasil Popular