Estou em Jericó, há cerca de 27km de Jerusalém, considerada área A (parte administrada pela Autoridade Palestina na Cisjordânia). O programa de Acompanhantes Ecumênicos que estou participando possui um time que trabalha em toda área do Vale do Jordão, especialmente com agricultores e comunidades beduínas que vivem do pastoreio de ovelhas e carneiros. A presença protetiva internacional é solicitada pois essas comunidades são alvos diários de ataques de colonos israelenses armados até os dentes, que povoam toda região da Cisjordânia e cujo projeto é de expansão territorial e expulsão das comunidades palestinas.
Hoje, 7 de outubro, chegamos por volta das 7h na comunidade Al Farisiya, onde vivem cerca de 5 famílias em tendas beduínas. Trata-se de uma comunidade pequena que se encontra esmagada entre dois colonatos, que são assentamentos ilegais.
Fizemos o pastoreio e as notícias começaram a chegar em torno de 8h30 ou 9h, ainda pela manhã. O nosso escritório de segurança local enviou informes e, neste primeiro momento, pediu que cancelássemos toda as atividades do dia, entretanto nós já estávamos em campo. Não demorou muito para chegar a solicitação para voltarmos para casa.
Daí para frente as coisas se escalaram muito rápido. Entre voltar do campo e encontrarmos nosso motorista – que é palestino – para ir para casa, já haviam relatos de ataques de colonos aos carros palestinos que transitavam entre as estradas da Cisjordânia, também da possibilidade de que as cidades e vilas começariam a serem sitiadas pelo exército israelense.
Dirigimos em direção a Jericó por uma hora e, ao chegarmos na primeira entrada da cidade, nos deparamos com bloqueios. Todas as entradas foram bloqueadas para entrada e saída. Uma forma de punição coletiva e desdobramento do que ocorreu. Conversamos com os soldados para nos liberar, alegando sermos apenas turistas, mas não houve diálogo. Logo o motorista, que mora na cidade, encontrou uma estrada aberta por uma “fazenda” Palestina. Entramos por essa estrada e conseguimos adentrar a cidade de Jericó e, enfim, chegar em casa.
Com urgência e diante da situação, o escritório emitiu um alerta de Estado de Emergência, solicitando quarentena total por dois dias até segunda ordem. Por outro lado, como a cidade ainda estava em clima de normalidade, com seu comércio aberto, estocamos um pouco de comida, o bastante para alimentar nosso grupo de quatro pessoas por alguns dias.
Após chegar em casa, seguimos em diálogo com uma comunidade beduína, em seus relatos o clima geral é de apoio e comoção, sentimento que vejo também entre os meus amigos palestinos. Ainda não sabemos o que acontecerá nos próximos dias, apesar dos ataques, ainda não há toque de recolher decretado pela Ocupação Israelense na Cisjordânia, a cidade de Jerico segue em clima de normalidade, mas há possibilidade de manifestações e que a população se levante numa terceira intifada.
*Igor Galvão é militante do Movimento Brasil Popular e atualmente reside na cidade de Jericó, na Cisjordânia
Edição Emilly Firmino