Freire se colocou ao lado do povo oprimido, deixou seu exemplo de um profundo compromisso com a transformação das estruturas arcaicas de nosso país. Foto: Reprodução
Luiza Troccoli, Coordenação Politico-Pedagógica da Escola Nacional Paulo Freire e militante do Movimento Brasil Popular
Há 103 anos atrás, em 19 de setembro de 1921, na cidade de Recife, nasceu Paulo Reglus Neves Freire. Este menino, que viria a se formar em Direito e abandonar a carreira de advogado para ser educador e pedagogo, hoje é Patrono da Educação Brasileira, um homem que mudou o paradigma de se pensar a educação não só em nosso país como em todo o mundo.
Em princípios de 1963, Paulo Freire iniciava a icônica experiência de alfabetização na cidade de Angicos, no interior do Rio Grande do Norte. As turmas colocadas em prática implementaram o método desenvolvido pelo educador de alfabetização de adultos em 40h, e se tornaram um importante símbolo da educação popular como impulsionadora da participação social. Isso porque, na época, apenas pessoas alfabetizadas tinham direito à voto, o que correspondia a apenas 40% da população brasileira. A experiência, que poderia ter sido nacionalizada impactando drasticamente o número de eleitores no Brasil, foi brutalmente interrompida pelo golpe militar.
Paulo Freire, a educadora Elza Freire – sua companheira de vida e de profissão – e toda a família, foram para o exílio, podendo retornar ao Brasil somente mais de 20 anos depois. Já se sabia o quanto a educação popular é perigosa para as elites do nosso país. Em sua trajetória enquanto educador e enquanto teórico, Paulo Freire sempre explicitou o caráter político das práticas educativas e de alfabetização e seu potencial de transformação das estruturas sociais.
Durante toda a sua vida, Freire se colocou ao lado do povo oprimido, deixou seu exemplo de um profundo compromisso com a transformação das estruturas arcaicas de nosso país através da emancipação humana, tendo a educação como uma prática da liberdade, como é dito no título de seu primeiro livro, publicado em 1967. O educador também foi exemplo de coerência, nos deixando um legado não apenas teórico, mas também de sua prática pedagógica em todos os lugares por onde passou no Brasil e no mundo.
Mais de meio século depois da experiência de Angicos, se iniciou a experiência da Escola Nacional Paulo Freire (ENPF), em São Paulo, no local do antigo Complexo Vergueiro, espaço da ordem dos dominicanos da Igreja Católica e que também é parte da memória da esquerda paulistana, tendo abrigado a primeira fábrica auto-gestionada de São Paulo, a Unilabor, e também o Centro Pastoral Vergueiro (CPV), centro de documentação, arquivo e pesquisa do movimento operário e de esquerda, importante pólo de resistência durante a ditadura.
Nossa escola começou a se organizar no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro, e de lá para cá, em conjunto com os movimentos populares e organizações sociais, enfrentamos a calamidade da pandemia de covid-19 e o genocídio do povo brasileiro, viemos resistindo ao avanço da agenda golpista e de retirada de dignidade do nosso povo, ajudamos a eleger Lula rumo à reconstrução nacional e seguimos na luta para a implementação do programa eleito nas urnas.
Em 2024, junto à celebração dos 103 anos de Paulo Freire, celebramos os 5 anos da Escola, tendo cada vez mais convicção da arma da educação popular para a transformação da realidade, e sabendo que essa transformação virá, necessariamente, pelas mãos do povo, ao exigir sua participação e protagonismo nos rumos da reconstrução do Brasil. Temos na metodologia dos Agentes Populares, nos Cursos de Realidade Brasileira, no impulsionamento da cultura popular e nos processos de Formação de Formadores nossa humilde contribuição para manter vivo o exemplo de Angicos na formação do povo para o exercício do poder!
Inspirados por Paulo Freire, temos que a vocação principal de nossa escola é ser um espaço de formação e de elaboração através da ciência popular e da sistematização de experiências. Em nossa caminhada, construímos a escola como um grande laboratório de experiências organizativas da juventude e da classe trabalhadora, e foi através da vivência, experimentação e estudo, que hoje afirmamos a nossa missão de elaboração de metodologias e processos de educação popular visando o estímulo à organização do povo.
Nos 103 anos de Paulo Freire e em nosso aniversário de 5 anos de existência, a Escola Nacional Paulo Freire renova seu compromisso com o povo brasileiro, e assume a responsabilidade colocada pelo nosso momento histórico de avançar no protagonismo popular e na democracia rumo a construção de um Projeto Popular para o Brasil! Assim, nos comprometemos com a continuidade do legado de Paulo Freire: Faremos Angicos de novo! Paulo Freire Vive!
*Este é um artigo de opinião pessoal e não necessariamente representa a posição do conjunto do Movimento Brasil Popular.